Mais tempo para assobiar e colher cana

quarta-feira, Fevereiro 10, 2021

A cultura de cana-de-açúcar vem de longa data no Brasil. Mais precisamente, desde o século 16, quando Martin Affonso de Souza trouxe de Portugal a primeira muda da planta. Desafios de todos os tipos foram enfrentados pelos agricultores desde então e o panorama foi mudando aos poucos, com introdução de novos equipamentos, técnicas e maior participação da região Centro-Sul nesse cenário. Assim chegamos em 2019/2020 com uma safra de 642,677 milhões de toneladas, mantendo o Brasil como responsável por 40% da produção mundial.

Jodemir Boisa e os irmãos Givanildo e Jovair enxergaram na cana-de-açúcar uma oportunidade para virar o jogo da vida. Para consolidar o Grupo Boisa, criado há 10 anos, Jodemir elenca três fatores primordiais: sorte, esforço e trabalho. Muito trabalho! Como prestadores de serviço para usinas em Penápolis (SP), eles decidiram um dia avançar também para o Alto Taquari (MT) e atender a BrasilAgro.

Além de unidos, os irmãos pensam de maneira muito semelhante quando o assunto é investimento em tecnologia. Tanto é que saíram na frente na aquisição da nova Colhedora de Cana CH950, lançada em 2020 pela John Deere, um equipamento com conceito totalmente novo.

Com duas linhas de corte simultâneo e independentes para espaçamentos de 1,4m e 1,5m, a nova CH950 tem como padrão um pacote de tecnologias que auxilia na qualidade da operação e da cana colhida. “O que eles tiraram de proveito da máquina foi surpreendente. Nas mãos deles o desempenho foi fantástico, acima da média observada”, diz Marcelo Pimenta, gerente de Vendas da John Deere.

Embora a máquina tenha capacidade para dobrar a colheita, esse resultado dependerá de fatores como tipo de solo, produtividade do canavial e planejamento do plantio. Os Irmãos Boisa testaram, aprovaram e compraram: “Em um dia normal, essa máquina colhe 130 toneladas por hora. Em certa ocasião exigimos o máximo dela e colhemos 160 toneladas em uma hora. A máquina de uma linha colhe cerca de 70 toneladas por hora”.

Nas mãos de pilotos de F-1

Uma frente de colheita hoje é composta, em média, por quatro máquinas de uma linha, acompanhadas de dois tratores para carregar o transbordo. No total, envolve 36 funcionários diretos. Com duas CH950 em operação, esse número cai para 21 pessoas envolvidas.

Os irmãos Boisa, por exemplo, contavam com quatro operadores fixos e dois folguistas para trabalhar com duas máquinas de uma linha. Agora, com a nova CH950, esse número reduziu para dois operadores fixos e um folguista. Após cada turno de 10 horas, a máquina permanece 4 horas parada. É nesse momento que eles realizam a manutenção, só que em apenas uma máquina e não mais em duas.

Para pilotar o equipamento, eles selecionaram dois “Ayrton Senna” da equipe. “Escolhemos a dedo nossos operadores. A qualidade da colheita com a CH950 é superior, com menos perda de estilhaço, de toletes etc. O pessoal nem acredita nos resultados”, comenta Jodemir.

Graças à tecnologia RowAdapt™, os dois conjuntos de corte e alimentação são ajustados automaticamente. A bitola da CH950 corresponde ao espaçamento entre linhas.

As esteiras ficam centralizadas, afastadas da soqueira e a entrelinha central permanece intacta. Dessa forma, 50% das entrelinhas não são trafegadas. “Cerca de 80% do canavial brasileiro utiliza espaçamento convencional e, com essa máquina, não é preciso alterar o sistema de plantio”, complementa Marcelo.

Segundo ele, estudos atualmente em desenvolvimento apontam que o cultivo da cana-de-açúcar poderá aumentar em um ou dois anos com o uso da CH950: “A máquina vai andar numa linha predeterminada sem compactar o sistema radicular do canavial. Então, no ano seguinte, o trator seguirá no mesmo rastro, preservando a raiz da cana”.

Acompanhando mudanças do setor

Embora hoje eles entendam tudo sobre cana-de-açúcar, os irmãos Boisa percorreram um longo caminho até aqui. De origem humilde, viram os pais e avós batalharem no campo como meeiros de café. Em uma área pequena, começaram a trabalhar com grãos, porém, era difícil competir com o mercado de cana naquela região do Estado de São Paulo. O jeito foi arrumar emprego em uma usina da região, antiga Usina Campestre. Ali ficaram cerca de quatro anos.

Nesse período o setor passou por transformação e a técnica de queima da palha de cana, usada para facilitar o corte manual, estava com os dias contados devido a questões ambientais. Os empresários do setor precisavam mecanizar a colheita. Foi aí que eles resolveram investir “o que não tinham” para lançar a Boisa & Boisa Serviços Agrícolas, iniciando a prestação de serviços de colheita na própria Usina Campestre.

Em 2010, eles decidiram locar uma máquina John Deere da Biopar (RJ) e, no ano seguinte, compraram o primeiro trator da marca, na concessionária D. Carvalho, com unidade em Penápolis. Maurício Carvalho, gerente corporativo de Pós-Venda da D. Carvalho, lembra bem da primeira colhedora comercializada a Boisa & Boisa: a 3520.

“A colheita de cana exige, primeiro, organização. Depois, dedicação. Sem isso não adianta ter empresa boa, nem equipamento e nem funcionário bom”

Jodemir Boisa

“Há forte identificação entre nossas empresas, temos características similares. Ambas são familiares e passam por momento de transformação. Temos muita liberdade em falar a respeito dessas mudanças. Os irmãos Boisa fazem críticas muito construtivas, apontam melhorias. Já promovemos mudanças em nossa unidade de Penópolis após sugestões deles. É muito bom ter um cliente que contribuiu para o desenvolvimento do nosso negócio também”, atesta.

Em dois lugares ao mesmo tempo

Outra luz brilhou nos negócios da família em 2018 e eles a seguiram sem pestanejar.  Aceitaram o desafio de abrir nova frente de trabalho em Alto Taquari (MT), a 600 quilômetros de distância de casa. O grupo BrasilAgro, fornecedora da Atvos (antiga Odebrecht Agroindustrial), terceirizou a colheita, o plantio e preparo do solo para os irmãos.

Inseguros em começar do zero a montagem de equipe local, eles resolveram transferir 20 funcionários de Penápolis para lá. Alugaram 21 casas na cidade. Uma delas para dividir entre os três irmãos, que se revezam nas idas e vindas a Penápolis para ficar com a família e levar adiante alguns negócios paralelos. Apenas 30% dos funcionários permanecem em Alto Taquari, uma vez que os demais optaram pelo retorno. Foi o tempo necessário para preparar o novo time com pessoas do lugar. “Nos preocupamos mais com o capricho do que com o ritmo”, observam.

O Grupo Boisa tem, hoje, quatro colhedoras da John Deere: três CH570 e a novíssima CH950. Os irmãos Boisa observam que em Mato Grosso a produtividade costuma ser maior devido ao clima e topografia favoráveis. Em média, em Alto Taquari a produção atinge 95 toneladas por hectare. Em Penápolis é em torno de 70 toneladas por hectare.

Seja em São Paulo ou no Mato Grosso, por onde os irmãos Boisa passam, deixam rastros de admiração e elogios. Na Real Máquinas, concessionária John Deere em Alto Taquari, eles são conhecidos pelos funcionários de todas as seções, tidos como um exemplo de organização. “Eles são profissionais ao extremo. O cuidado com os tratores, os caminhões e as colhedoras da cana são impressionantes. São muito unidos e pensam absolutamente em tudo: na limpeza do ambiente, na organização da área de convivência, na ecologia, em tudo”, destaca Antônio Soares, gerente geral de Negócios da Real Máquinas.

Assim como Maurício Carvalho, da D. Carvalho, ele admira o espírito colaborativo e as críticas construtivas de Jodemir, Jovair e Givanildo. “Para nós, é importante perceber o quanto o concessionário pode aprender com pessoas como eles. É, ao mesmo tempo, tão simples e tão fácil trabalhar com quem gosta do que faz”.

“Esse lançamento significa não apenas uma revolução na colheita, como também em toda a cadeia de valor da colheita mecanizada. Impacta a logística, as pessoas e o sistema de transbordo”

Marcelo Pimenta


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